Meu Deus, venho pedir perdão de
meus pecados. Imploro vossa Misericórdia e vossa graça para aceitar a pequenez
de Tua cria indigna de paz. Meu Senhor e meu Deus, dá-me luz para conhecer os
meus pecados, e graça para deles me arrepender. Minha Mãe imaculada, São José,
meu pai e senhor, meu anjo da guarda, intercedei pela pobreza de minha vaidade
que nem ao menos vangloria de forma suficiente esta carcaça que se desfaz em pó
e silêncio, sem que muito se perceba ou se diga qualquer coisa nesse silêncio
cruel de Tuas vontades errôneas e não confessas. Entoo num fôlego só. Em suas
vestimentas lisas é pouco o dourado ao branco do tempo pascal que em estola lhe
veste do pescoço aos joelhos: uma pomba que voa em gotas de ouro, e o brilho do
olhar indiferente de quem parece ouvir numa ausência santa, fidedigno retrato
de Deus para conosco, filhos tortos diletantes do caminho sem resposta. Faz-se
ali a remição Dele para Ele, em que se obriga a perdoar-se pela obra mal feita
capaz inclusive de ver na imagem indiferente do homem trajado de panos claros a
sintonia alva do acolhimento divino, transmutar o reflexo de nossa imperfeição
na esperança do amor que ama de jeitos tão impossíveis aos nossos peitos
desertos. Faz tempo, padre, e duvido muito que de fato perceba que àquela sala
divide agora outra quietude que não apenas seu silêncio. Não me ajoelho pelo
desejo de não despertar mais desgosto aos olhos de Deus, e acredito realmente
que a estátua de carne e osso e pecado que me ignora é a personificação fiel do
encontro que sonho com meu Pai. Faz tempo, meu Pai. Já não mais lhe aborreço
com discursos ensaiados pela hora de dormir. Acredito que ainda na infância
dispensei em carinho o cuidado de Teus anjos, julguei-me pronto a encarar madrugadas sem camisa, minha mãe dizendo Filho, se dormir sem camisa o anjo da
guarda não vem, eu ensaiando inconsciente o sono sem sonho que é o caminho de
todo homem que é pó por Ti moldado. Meu Deus, toda graça pela criatividade infinita e alheia às nossas
perguntas. Reconheço Tua grandiosidade e fortaleza, Tua forma incomparável nos chega
apenas como arrepio pela incapacidade humana de nomear desígnios perfeitos.
Fez-nos à imagem e semelhança de uma forma sem reflexo, e pobres são nossas
intenções de partilhar tua completude. Ris, e infinitamente belo me parece tal
riso. O padre coça o nariz e por um instante toma a forma de homem, vestes que
não condizem aos gestos animalescos que nossa candura e silêncio tanto
externam. Sinto pena de mim pela infinito dom humano de ter ao redor diferentes
formas de idênticos moldes de vazio e pequenez, e ao que parece Deus logo cansa
desses nossos dramalhões tipicamente nossos e toma as rédeas da atenção do
corpo ornamentado em pouco dourado. Saibas que não é desafio, que não exijo
provas e acho graça ter tido um peito de criança que batia demais e agora soa quieto
pelos quartos escuros que tanto um dia nos dirão sem dizer. Hoje é a cabeça que
incomoda, uma dor que paira o patológico e o silêncio transposto de nosso
músculo cardíaco à massa cerebral. Ao peito as coisas parecem mais vivas,
Senhor, e Tu bem sabes disso e de tudo que um dia jamais chegaremos à sequer
poder entender pelos recados luminosos que deixa à vastidão de cegos daqui. Na
cabeça fica tudo confuso e cético, sem a cadência do peito que entoa fantasias
às perguntas sem respostas que entre miocárdios por vezes travam e nos
escurecem da ilusão da vida os olhos fechados ao Teus planos impossíveis a nós.
É que a vida nos dá cigarros e garrafas que por vezes escondem o amargo do
gosto numa lembrança azeda de pitanga madura, e isso nada lhe diz. Uma vida que
esconde o agora pelo preso da alma ao que se diz lembrança e necessária, sendo
o tempo mistério em nossas teorias frente Tua existência que desconhece lacunas.
Parece cruel de nossa parte querer de Teu plano qualquer coisa, já que não nos
pertencemos, somos uma relação causal que engatinha sem perspectiva de quando saberemos caminhar, se quiçá poderemos um dia ser guiados a qualquer lugar que não nosso próprio vazio. É mais pra fugir das magias do
sono, pra esquecer das tempestades da cabeça que já não voltam mais ao peito. Esvazio,
e não sei o motivo de tanto tardar Deus em largar os olhos agora já não
dourados do Padre. Assente quase calmo. A juventude é incerta, diz. Sorrio. Meu
Senhor e meu Deus, eu me arrependo de todo coração por vos ter ofendido, pois
sois tão bom e amável. Prometo com a vossa graça nunca mais pecar. Meu Jesus, misericórdia
de nossa ignorância. Perdoa sermos transparentes à sua imagem e semelhança que não
nos é suportada, que não nos é nada que não indigna. Perdão, sabendo que já é pedir demais.
à fé de minha Mãe