Sinto que fiz a coisa certa, e por mais que eu continue subestimando a ordem natural das coisas quando digo nunca estar errado sobre aquilo que sinto, não consigo me lembrar de algum dia em que me vi errado. Os pênaltis que pressenti terem destino na trave, e que se tornaram cervejas pagas com a má vontade daquele que perde o antes já ganho, com toda a certeza não valem os sinais das amizades traídas, não valem o frio que o vento da nuvem cinza sopra antes de descansar sobre todos os meus amores de festim. Sim, também acho que saber dessas coisas não seja a melhor coisa do mundo, mas tantas foram as 5 da manhã transformadas em última lembrança antes de um sono de mentira, que já não me importo tanto em ser egoísta, em cultivar cá dentro o que lá já florescera alguns telefonemas atrás.
Deus sabe, Deus sabe que eu fiz a coisa certa.
Merecia mesmo ser recompensado pela insistência. Do alto daqueles pés de veias saltadas, tudo que ela fazia era fingir não estar à meia valsa de mim, e com a mesma piedade que acabava com meus trocados nos semáforos, me dava não mais que meios olhares divididos em pequenas metades de sua parte já não mais inteira. Queria mesmo que soubesse que tudo que faço é por ela, que quero dizer as coisas que a muito já dormiram aqui dentro só pra ela saber que eu não sei o que houve, que não aceito o fato de não ter dado certo a única coisa certa na minha vida.
Fiquei alguns copos de cerveja até que aquele vestido roxo trouxesse-a até a metade desocupada do meu banco. Falou que tinha parado de fumar, alguma coisa assim. Perguntei porque me disse aquilo, ela disse que eu havia perguntado. Falei em menos tempo que o ensaio, e mais forcei uma voz rouca do que propriamente deixei-a gasta. Ela fez cara que não gostou, filosofou algum conceito barato sobre deixar as coisas quietas pelo bem de todos, e nem mesmo tentou segurar meu braço quando levantei rindo de mãos no bolso.
Fui embora.
Fui embora não por ter reconhecido um erro sem volta, por ter ouvido da minha boca uma frase sem sentido; fui embora por ter visto de novo tudo que sempre esteve por perto. Enquanto apressava as pernas meus pés se perguntavam pelo destino, e mudava de calçada incessantemente pra não precisar conversar nem comigo mesmo. Não me via errado pela história da viagem, e à medida que deixava de lado, sentia uma vontade estranha de dizer a verdade, de não deixar mais nada pra acertar depois. Só não me sinto certo pelas declarações interrompidas com risos, pelas vezes em que ela acordava e pedia pra eu voltar uma ou duas frases naquilo que tentei dizer todo o tempo. Queria que ela lembrasse.
Deveria mesmo ter voltado, pedido desculpas pelas vezes que me convenci ser o principal da nossa história simples até demais; admitir que agi todo o tempo como aqueles que critiquei, como aqueles que queriam compreensão sem nem ao certo saber o que se passa. Deveria ter dito que fomos mais que tudo isso, e que se eu tivesse me levado pra passear com meus problemas por outras bandas que não teu coração, alternaríamos o sábado entre a minha e a tua cama.