quinta-feira, 22 de abril de 2010

Era Uma Vez...

Não falar nada e apenas sair andando talvez tenha sido o troco pra dívida repleta de juros que não corrigia nada. Fiquei, até pensei em sair correndo atrás, senti seu tapa na cara e o empurrão sem jeito no peito e não fiz nada. Tempos depois pensei como me acharam idiota os que passavam pela frente do quiosque e encaravam o mais novo poste do calçadão, parado como todos os outros irmãos de cabeças luminosas. Devo ter ficado mais de dez minutos imóvel, sem pensar em nada e vagando por entre as pegadas que teus pés iam deixando no caminho pra longe da minha luz. Se você tivesse esperado, se tivesse quisto não querer acreditar nas coisas que ouvia da minha boca cheia de sinceridade e de dentes não tão bem escovados, talvez ficasse até um pouco surpresa, talvez chegasse a esconder o rosto nas mãos antes de deixar a bolsa no banco e sair andando pelas beiradas da minha boca. Se você tivesse esperado seria tudo seu, seria todo seu e de mais eu nenhum.

Eu não te peço pra entender, me viro com o que sobrar e faço música se resolver tirar de mim até o teu silêncio; do teu desgosto eu faço tempero, sirvo o lugar vazio na mesa com seu prato preferido e brindo a mim o que por muito tempo permanecerá sendo. É que se soubesse o porquê de cada uma delas, se soubesse que dividir o teu amor era mais certo do que ser um só, quieto; mas não tem jeito, e não ter jeito deve ser o destino de muitas das coisas. Do mais é protelar, é levar pra tempo extra o que o 43 do segundo tempo resolveria sem mais problemas.

E quando não me sobra mais nada na cabeça, coloco as mãos na nuca e desejo com todas as minhas dores no peito que você queira tanto quanto eu saber mais do que só a minha primeira frase. Viro de lado e faço força pra voltar pro mesmo sonho, pra ver se depois que minhas letras entrarem pelo teu ouvido você vai ficar sentada e pronta pra me odiar um pouco mais.

Mas não é assim, e depois de conseguir piscar, sentar com meu cigarro e subir meus olhos pro alto daquele prédio foi o que sobrou. Eu não tinha a mínima idéia se ela estava em casa, não me preocupavam os pivetes que passaram pela segunda vez e colocaram a mão no bolso em sinal de respeito ao que tinha acontecido. Eu só sabia que queria ficar por ali, me confessando quieto com a certeza de que a mão dela na minha faria repensar se tudo aquilo valia a pena.

Longe dela, aqui de baixo no topo do egoísmo, gosto daqueles olhos mais do que qualquer outra coisa; amo a empregada daquela casa mais do que a dona da minha mão direita pelo simples fato de abrir as cortinas e me fazer varrer toda a calçada muito mais rápido. Do meu lado ela vai embora, do meu lado eu faço ela ir embora.

Sim, eu ainda estou aqui.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Talcahuano

E tira por conclusão de tudo que, nesta vida, mais se perguntará sobre os silêncios sem resposta do que qualquer outra coisa; quem sabe ficar apenas sem resposta possa tomar o primeiro lugar nessa lista quieta que faz suas pernas rodarem a cadeira cada vez mais rápido, que faz seus dedos não terem espaço e nem o tempo merecido pra desabafar tudo que um sistema calmo e calado lhes ordena com mais pressa que certeza. É esse seu jeito de sorrir pro espelho enquanto a música lhe bate o fundo dos ouvidos e levanta todos aqueles que só existem quando o arrepio vale realmente as suas penas.

Todos os Dominantes talvez estejam mesmo certos, e a única coisa que acompanha o olhar na falta de mudança durante a vida são mesmo as paixões. Sim, ele? Um precoce apaixonado do silêncio que as músicas trazem, dos alvos pensamentos que as legendas dos filmes tingem em suas escancaradas certezas. É tudo repetição, não tem jeito! O que muda é o nome no rodapé, o que intercala é a ordem dos acordes, e os motivos ainda são os mesmos, e as paixões ainda são iguais.

Quer que os vícios sejam considerados paixões que saíram dos eixos, que extrapolaram o prazer de tomar um porre pelo simples prazer de fazer o mundo rodar, de puxar para frente das canelas toda e qualquer cadeira antes longe e imóvel. E se tudo não der certo, vai tirar o casaco pendurado na sua cadeira e sair do escritório bem no meio do expediente; vai dobrar a Santa Fé e ir descendo a Talcahuano com um filtro vermelho na boca e nada na cabeça. Vai passar por hotéis, vai sorrir pra turistas e pegar prostitutas no orelhão até poder brincar com os círculos do copo no balcão de sua segunda casa.

Apenas um apaixonado, nada mais que isso.


‘’Entendeu Benjamín? As pessoas podem mudar de tudo: de cara, de casa, de família, de namorada, de religião, de Deus! Mas tem uma coisa que não se pode mudar Benjamín. Não se pode trocar de paixão. ’’

El Secreto de Sus Ojos – Juan José Campanella

sábado, 3 de abril de 2010

Meu Papel

Sinto que fiz a coisa certa, e por mais que eu continue subestimando a ordem natural das coisas quando digo nunca estar errado sobre aquilo que sinto, não consigo me lembrar de algum dia em que me vi errado. Os pênaltis que pressenti terem destino na trave, e que se tornaram cervejas pagas com a má vontade daquele que perde o antes já ganho, com toda a certeza não valem os sinais das amizades traídas, não valem o frio que o vento da nuvem cinza sopra antes de descansar sobre todos os meus amores de festim. Sim, também acho que saber dessas coisas não seja a melhor coisa do mundo, mas tantas foram as 5 da manhã transformadas em última lembrança antes de um sono de mentira, que já não me importo tanto em ser egoísta, em cultivar cá dentro o que lá já florescera alguns telefonemas atrás.

Deus sabe, Deus sabe que eu fiz a coisa certa.

Merecia mesmo ser recompensado pela insistência. Do alto daqueles pés de veias saltadas, tudo que ela fazia era fingir não estar à meia valsa de mim, e com a mesma piedade que acabava com meus trocados nos semáforos, me dava não mais que meios olhares divididos em pequenas metades de sua parte já não mais inteira. Queria mesmo que soubesse que tudo que faço é por ela, que quero dizer as coisas que a muito já dormiram aqui dentro só pra ela saber que eu não sei o que houve, que não aceito o fato de não ter dado certo a única coisa certa na minha vida.

Fiquei alguns copos de cerveja até que aquele vestido roxo trouxesse-a até a metade desocupada do meu banco. Falou que tinha parado de fumar, alguma coisa assim. Perguntei porque me disse aquilo, ela disse que eu havia perguntado. Falei em menos tempo que o ensaio, e mais forcei uma voz rouca do que propriamente deixei-a gasta. Ela fez cara que não gostou, filosofou algum conceito barato sobre deixar as coisas quietas pelo bem de todos, e nem mesmo tentou segurar meu braço quando levantei rindo de mãos no bolso.

Fui embora.

Fui embora não por ter reconhecido um erro sem volta, por ter ouvido da minha boca uma frase sem sentido; fui embora por ter visto de novo tudo que sempre esteve por perto. Enquanto apressava as pernas meus pés se perguntavam pelo destino, e mudava de calçada incessantemente pra não precisar conversar nem comigo mesmo. Não me via errado pela história da viagem, e à medida que deixava de lado, sentia uma vontade estranha de dizer a verdade, de não deixar mais nada pra acertar depois. Só não me sinto certo pelas declarações interrompidas com risos, pelas vezes em que ela acordava e pedia pra eu voltar uma ou duas frases naquilo que tentei dizer todo o tempo. Queria que ela lembrasse.

Deveria mesmo ter voltado, pedido desculpas pelas vezes que me convenci ser o principal da nossa história simples até demais; admitir que agi todo o tempo como aqueles que critiquei, como aqueles que queriam compreensão sem nem ao certo saber o que se passa. Deveria ter dito que fomos mais que tudo isso, e que se eu tivesse me levado pra passear com meus problemas por outras bandas que não teu coração, alternaríamos o sábado entre a minha e a tua cama.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Seu Papel

Eu não queria que ele me tivesse dito as coisas que disse, que tivesse feito promessas grandes demais para o pouco que tinha sobrado; mas mais do que fazer foi eu ter ouvido e acreditado que as tais coisas lavariam sua roupa suja na máquina de lavar ganha de presente de casamento, que depois dormiriam em um colchão de solteiro esticado na sala já que a loja pediu um prazo extra para a entrega da cama.

Só eu sei como sinto pena de mim por ter parado com os cigarros.

Ele não veio, e nessa história toda esta é a parte que mais interessa. ‘’Ele não veio’’ poderia ficar ecoando em todos os meios olhares que trocávamos, em todos os pensamentos que dedicávamos enquanto sorrir e balançar a cabeça disfarçava a vontade de sufocar a parede do banheiro. Se eu não soubesse do fim das coisas, talvez tudo até ficasse bem; se soubesse que toda vez que finge não me ver eu me lembro de como ele descobria o peito com o lençol pra depois pedir desculpas por se sentir tão pequeno frente à minha pose inabalável, frente à segurança que nunca mais terei com nenhum outro beijo recebido no nariz.

Tudo bem que eu nunca abri a boca pra dizer pra onde eu ia quando sentava por minutos na minha cama, tudo bem que sempre fiquei chateada quando ele sabia de tudo antes mesmo de eu abrir a boca; só não acho que isso seja suficiente para que de repente ele se cale, haja como se eu tivesse traído sendo que quem voltou sem avisar da viagem não fui eu. Talvez eu tenha me vista tão presa naqueles cachos mal formados, que o desafio de desatar os nossos simples laços foi mais forte que simplesmente deixar as coisas irem pelas próprias pernas.

Sozinha assim eu não sou de todo mal, eu sinto. Sei que pensa em mim todas as noites, que desliga o celular todas as noites antes mesmo do primeiro toque pensar em bater na porta dos meus sonhos estranhos. Tento me apegar nos vinte dois motivos que ele deixava em suas entrelinhas pra mandar tudo pro fundo desse silêncio sem sentido e sem complicação; mas no décimo terceiro eu apenas paro e olho pra minha mão direita, vejo a minha coluna arrepiada de olhos fechados e meus abraços que de delicados nada tinham.

E assim ele já está tão aqui que eu não preciso nem buscá-lo na portaria, não preciso nem me preocupar com sua fome já que sei que tudo que suas orelhas precisam é beijar meu peito descoberto, é beijar meus sussurros meio mansos, meio inquietos. Se ele realmente tivesse vindo eu provavelmente não precisaria desamarrar as coisas que insistem em se entrelaçar, eu provavelmente nem repararia que pensar é descer escada rolante pra cima, entrar na porta engraçada do banco de olhos fechados pra nunca mais parar.

Ah se ele tivesse vindo! Ah se eu não tivesse parado com os tais cigarros!



‘’Not unless you stay.’’

Little Joy – Play The Part