segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Outra vez

E se encontrava nas palavras de qualquer um com mais de 80 anos. Tinha notado que o excesso de vida causava um discernimento capaz de despir peça por peça qualquer verdade nua e crua. Talvez ele fosse assim, meio bom e meio seco, e como todo o mundo, também tinha suas reclamações a serem feitas com a vida.

Todos seus problemas tinham uma solução, mas não via muito sentido em preferir pensar em suas putas à realmente tê-las em seus lençóis e abraços. Dentre tudo aquilo que marca a vida das pessoas, ele sabe que mais prometeu do que recebeu promessas, e sabe que mais prometeu com sua cabeça longe da conversa do que com olhos perto dos outros. Pra ele as coisas apenas bastam, e a vida lhe convém ser muito boa a ponto de fazê-lo sorrir, ou tão ruim que nem digna de reclamação lhe parece ser.

Quem sabe as coisas fossem diferentes se conseguisse enxergar dois palmos à frente ao invés de alguns atrás; nada lhe faz mal, mal nada lhe faz. Tem um poder de se acostumar com as coisas que se confunde até com comodismo. Quem sabe ele viva com a certeza de que as coisas sempre andam no muro do talvez, e param inúmeras vezes pra recobrar o equilíbrio antes de cair de cara no sim. Talvez seja por isso que vê-la com cabelo preso e olhos perdidos lhe basta por enquanto.

Linda.

Um almoço de domingo é disparado o maior desejo que consegue ter. Sente falta das coisas como se elas resolvessem voltar sem aviso prévio, todas de uma vez. Dos seus fantasmas, nada mais que um casal e uma árvore desinformada, e de suas alegrias, todas ao som de samba e peso de cigarro.

Parece tão egoísta que nem pra si próprio faz a vida girar, e analisa duas vezes se vale a pena pensar no próprio umbigo. É tão sincero que não faz questão de ser triste para o mundo e feliz só pra um sorriso; não consegue, não faz questão de mudar a direção que as coisas tomaram. Seu ciúme não é sentimento, é apenas estopim pra fantasiar briga que termina com beijos apaixonados. Guarda estes como as coisas que tem de falar, e não abre essas gavetas por mania de fazer filme qualquer coisa do cotidiano. As vezes penso que é tão egoísta que tem necessidade de ser importante na vida das pessoas. Talvez seja isso. Não raras são as vezes em que pensa ''e se soubessem tudo que se passa aqui dentro?'', mas no fundo ele não é tão bom com as palavras da forma que se dá bem com a sorte.

O que não lhe sai da cabeça é ela de um lado, procurando sem muito esconder, e ele do outro, disfarçando com cara de surpreso o cubo de gelo que começara a atacar costurado sob sua barriga. É ela levantando sem olhar pra trás, e ele lendo algumas vezes a mesma frase, antes de achar qualquer desculpa pra começar a torcida de tudo ser um plano que o leva até uma escada vazia. Por fim, não lhe sai da cabeça ela pequena através de uma janela qualquer, e as mãos dele nos bolsos não querendo dizer nada.

Arquibancada vazia, e só.

Por fim, sei muito bem que é dessa forma que ele se faz pra si e para o mundo, mas tenho certeza que não é desse jeito que os outros imaginam que ele seja pra si e mais ninguém.

- na real? você me dá muita raiva!

- porque?!

- a idéia de perder sua ''cara sem palavras'' me irrita demais! se soubesse tudo que tenho pra te falar...

- e porque não fala?!

- por nada.

Artista Desconhecido - Faixa Desconhecida