segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Daqui

Chega, um tempo – de sola do pé no peito do outro, esperando de fato que o tempo logo venha trazendo as medidas do vazio, desenhando na cortina a extensão da madrugada, outro possível capítulo de sonho – desses não dura tanto tempo assim. Se o que sinto extensão de pensamentos fosse tão físico quanto os dedos no copo suado, não me chatearia a ideia de ver migalhas de mim pelos cantos, normalmente mais velhas do que eu, em formas de vozes que não as minhas, de palavras em linhas de meu jeito que não vêm de minhas mãos. Talvez o tempo já tenha vindo pra cá por estes tempos mesmo, nos primeiros dias do ano que só se vão sem pressa, de noite empurrada pelo sol, estranhando a madrugada que não nos chega pela noite que a gente prolonga, engana. Um dia chega o dia de me acostumar com as dores que aumentam.

O medo fica longe de ser qualquer coisa que não chega. Sim, amante das certezas que chegam no vento, certas de não nos serem certas antes da certeza lenta, da cabeça que clareia no gelado da barriga. É por ter ficado tanta coisa pra trás que do hoje pouco guardo. Acho que chega uma hora na vida que de fato é posto relógio no pulso, e a economia em cada frase é pra evitar o peso de toda simples responsabilidade. Do desejo por qualquer coisa que dura sobra quase que só o avesso, e não me falo nada por já ter aprendido a seguir meus sapatos dessa forma cega, quase que leal. De repente, assim como todos os outros que amanhecem pesados de um tempo que não viram passar, me sinto convencido em seguir, refém de uma vida que só me faz me acostumar, ter por certo na balança o que já não tem peso ou vontade pra sentir de qualquer forma que não vazio, assim sem jeito.

Sinto tudo à volta como parte de quem sonha ou de quem silencia passos firmes pra manter o sono das dúvidas. Paz não é objetivo: é noite sem vento, varanda que vigia rua sem movimento; paz é o sossego, derrota que não brava, que enche aos poucos de silêncio o que por muito foi grito de dúvida, sede de resposta; paz é não pensar em nada, é a inveja do descanso de quem dormiu suas angústias pra conseguir apenas ser, sofrer pelas dores da vida como passageiro, e não como quem insiste em entender sentidos complexos, dicotomias infantis.

E por ter na ironia esperança de encontrar, continuo, ainda que manso, desse jeito que cobra caro, que dá num afago os prazeres que mando embora pelo simples medo disfarçado de responsabilidade, de princípios que se pegam em mim, que me tiram de mim a medida que modelam as poucas respostas que tenho. Se pelo menos as coisas que passam fossem do tempo de tudo que penso, julgaria com os olhos do peito sem o peso que a consciência coloca em tudo que de dentro dela não é. Por assim ser, sem fórma e sem fôrma, digo nada, penso apenas que pouca coisa conquistei perto do muito que quero sem poder nem mesmo poder. O medo é coisa simples, passo não dado sem pensar; é tudo que tiro do concreto e dissolvo em ideias, que nunca servirá pra nada que não estes clarões que levam minha cabeça pra longe, que trazem essa minha paz pra perto.


"ele não sabe ser melhor, viu?"

De Onde Vem a Calma - Los Hermanos